Aliança Negra nos Estados Unidos: incidência internacional por justiça e pelo fim da violência racial
Intercâmbio estabeleceu parcerias e simbolizou o compromisso de luta pelo direito a uma vida livre de opressões
Entre os dias 29 de maio e 9 de junho, o Aliança Negra Pelo Fim da Violência protagonizou duas semanas marcantes de incidência política internacional nos Estados Unidos. A delegação, composta por representantes de 16 organizações influentes do movimento negro brasileiro, tem como algumas das principais características a potência, a pluralidade e a experiência das lideranças, atuantes há mais de 30 anos no Brasil. O grupo participou de encontros com organizações renomadas, fortalecendo o diálogo e a colaboração internacional neste momento de retomada, tanto da democracia brasileira como da estadunidense.
Essa imersão nos Estados Unidos permitiu ao Aliança Negra estabelecer compromissos significativos com lideranças e ativistas das Américas. Foram criadas conexões e firmados compromissos para fortalecer a luta por justiça e igualdade. Os eventos e reuniões trouxeram à tona diversos assuntos relevantes, como a violência racial e de gênero, a importância da representatividade e inclusão, além da necessidade de se restabelecer um estado democrático pleno, com políticas públicas efetivas para combater o racismo estrutural.
Uma iniciativa inédita marcou esse intercâmbio: em todas as atividades oficiais, a delegação do Aliança Negra entregou o dossiê “Uma Aliança pelo Bem Viver – pelo direito universal de respirar e o fim da violência racial contra a população negra”. O documento, assinado pelas 16 organizações, contextualiza o cenário da violência racial no Brasil, propõe medidas embasadas nas lutas dos grupos e aponta recomendações para combater o problema.
Nova Iorque
Durante a primeira semana nos Estados Unidos, o Aliança Negra realizou uma intensa agenda de atividades em Nova Iorque, fortalecendo laços com organizações como BrazilFoundation , Ford Foundation , ONU Mulheres Brasil , Consulado Brasileiro, Schomburg Center for Research in Black Culture e Black Trans Media. A delegação também promoveu um evento aberto ao público e à mídia norte-americana no The People’s Forum, com apoio do Comitê Defend Democracy in Brazil – New York.
Foram intensos debates e muitas informações compartilhadas entre as integrantes do Aliança Negra e lideranças internacionais. Na Fundação Ford, emergiram discussões importantes sobre violência sexual contra mulheres e invisibilização da população trans, todas com a participação de renomadas ativistas do Brasil e dos EUA.
No Schomburg Center for Research in Black Culture, a diretora da instituição, Joy L. Bovins, enfatizou o fato de “abrigar uma vasta gama de programas e coleções, abarcando mais de 11 milhões de itens que iluminam a riqueza da história, das artes e da cultura negra em escala global”. Ela também solicitou às lideranças brasileiras que “compartilhem suas pesquisas no futuro, fortalecendo o compromisso da instituição em valorizar as contribuições intelectuais e criativas do Brasil”.
Outro marco importante do intercâmbio foi a participação ativa do Aliança Negra na sessão do Fórum Permanente de Afrodescendentes da ONU, onde foram discutidos os desafios enfrentados pela população negra globalmente. Foi um espaço para aprofundar discussões sobre inclusão, educação, mercado de trabalho e superação do racismo institucional.
A delegação do Aliança Negra participou de mesas de discussão com líderes da Colômbia e da República Dominicana sobre direitos das mulheres, interseccionalidade e o papel da sociedade civil no combate à violência de raça e gênero na América Latina.
Comunidade trans
Foi bastante significativa também a reunião na sede do Black Trans Media, onde o grupo dialogou com a fundadora do Black Trans Fund, Bré Rivera, e outras lideranças trans negras norte-americanas. Nessa reunião, foram abordadas questões relacionadas aos direitos e à proteção da população trans negra nas Américas.
Essa imersão permitiu ao Aliança Negra estabelecer compromissos significativos com lideranças e ativistas engajadas na luta pelos direitos e pelo bem-estar da comunidade trans negra, fortalecendo os laços de solidariedade e ampliando a conscientização sobre as questões transnacionais que afetam diretamente essa comunidade.
Washigton, DC
Na capital dos Estados Unidos, as ativistas participaram de reuniões no Departamento de Relações Exteriores do Congresso Americano, na Organización de los Estados Americanos (OEA), na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), no Departamento do Hemisfério Ocidental e no Escritório Especial dos EUA para Promoção dos Direitos Humanos da Pessoa LGBTQI+. O apoio local foi do Institute on Race, Equality and Human Rights e do Washington Brazil Office.
No Congresso, as ativistas brasileiras, juntamente com as lideranças dominicanas e colombianas, se reuniram com a diretora da Unidade de Raça, Etnia e Inclusão Social do Escritório de Assuntos do Hemisfério Ocidental, Zakyia Carr Johnson, e outros representantes da instituição. Sob o tema “Violência Racial e Acesso à Justiça na América Latina”, o debate girou em torno de questões relacionadas aos direitos das mulheres negras em seus países, como violência racial e acesso à justiça.
As lideranças presentes propuseram o compromisso de não se calar diante da violência, especialmente sobre o extermínio de mulheres negras no Brasil, dando visibilidade internacional a esses casos. Recomendaram também o fortalecimento da agenda por meio do intercâmbio entre líderes, ativistas e parlamentares negros cis e trans das Américas.
Em todas as reuniões houve intensa troca de informações, permitindo que todas as participantes conhecessem os desafios enfrentados em seus respectivos países e comunidades. Foram destacadas as violações de direitos enfrentadas pelas mulheres negras, especialmente na região amazônica do Brasil, onde muitas enfrentam dificuldades de acesso à educação. Também foram mencionados os assassinatos de quilombolas e indígenas, uma vez que há relatos de empresas e bancos norte-americanos financiando ações que violam os direitos destes povos na região.
Cultura Negra
Além das agendas políticas, as ativistas também desfrutaram de uma imersão cultural explorando pontos emblemáticos das cidades que visitaram. Em Nova Iorque, elas mergulharam na história e significado de locais simbólicos. Foram ao Harlem, no emblemático cruzamento das ruas do ponto de encontro de dois gigantes da luta pelos direitos civis, Malcolm X e Martin Luther King Jr, passando pelo centro da Big Apple, na Grand Central, até a Quinta Avenida, e chegando ao Brooklyn, um bairro historicamente marcado pela importância da cultura negra e da luta pelos direitos civis.
Em Washigton, visitaram o Smithsonian National Museum of African American History & Culture e o Memorial de Martin Luther King Jr. No encerramento da agenda oficial, houve um encontro emocionante no Ipàdé – espaço dedicado ao desenvolvimento de atividades relacionadas ao atendimento à mulher negra.
Com a condução da diretora executiva, criadora e fundadora do Black Women Radicals, Jaimee A. Swift, as líderes do Aliança Negra, ao lado de outras mulheres negras latino-americanas, falaram sobre a importância desse intercâmbio entre pessoas da diáspora. Elas também realizaram uma análise cuidadosa e metodológica da situação atual para guiar as ações organizacionais nos respectivos países, sempre considerando a influência global.
“Estabelecer uma aliança entre as Américas é essencial para promover a liberdade fundamental e buscar soluções conjuntas para os desafios enfrentados”. Jaimee A. Swift
O Aliança Negra concluiu o intercâmbio nos Estados Unidos com um compromisso renovado de continuar lutando contra a violência de raça e de gênero, buscando parcerias e soluções conjuntas para combater os desafios enfrentados pelas comunidades negras. A expectativa é que esses diálogos e colaborações inspirem mudanças profundas e duradouras, promovendo uma sociedade mais justa e igualitária para todos.